1970. Carta familiar entre marido e mulher. De Peniche para [Lisboa]. FLY0002

FLY0002
Carta familiar entre marido e mulher. De Peniche para [Lisboa].

Data
30/01/1970

Referência Arquivística
N.A.
Arquivo Privado, Arquivo Privado, FLY0002, Fólios [1]r-v

Resumo
O autor partilha com a destinatária o orgulho e a preocupação que tem com as filhas. Narra o seu quotidiano na prisão e termina felicitando a mulher pelo seu aniversário; relembra, a propósito, aniversários anteriores que os dois festejaram juntos.

Local
Peniche

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Autor | Destinatário | Contexto | Palavras Chave | Suporte Material | Créditos


Texto

Fl. [1]r

Peniche

30. Janeiro. 1970

Minha querida:

A tua saude? Tens-te sentido melhor? Como é que estás ultimamente?
A [N] escreveu-me brevemente sobre a [N]. Fiquei contente porque a miuda parece
alegre, até certo ponto adaptada, reconquistando expressões e expansões antigas que me calavam fundo:
as altas gargalhadas, os grandes gritos, a meiguice, as perguntas, o à-vontade, a exuberância, a
maravilhosa coisinha natural que era. Encantou-se com o teu telefonema; perguntou depois à
Mana: "A minha Mãe tem uma voz muito linda, não achas?"

Têm ido ambas à Aguda todos os domingos, onde dão grandes passeatas com o
[N] e ficam felizes. Também ele me escreveu. Mas da [N] pouco mais sei, e dói-me.
É já noite. Reparo que só o é para nós, aqui. De facto, são cerca
de nove horas - é quase dia, afinal. Lentamente os rituais de vida vão-se amoldando
aos horários, e o que é verdade é que, dentro de menos de duas , horas, estarei dei-
tado, prestes a dormir.

Estive a escrever o segundo postal à [N], a lavar-me e a pensar
no que te iria dizer, a ti que não consegues vencer essa preguiça toda de escrevinhar.

Teimo, no entanto, em mandar-te esta carta porque fazes anos e
não sei se terei outra oportunidade de te dar os parabens e te desejar por
muitos anos e muito bons, alegres, satisfeitos, felizes até.

Recordo os teus anos, dos primeiros a que assisti e alguns outros,
não todos. O dia de hoje, também. Afinal é facil ver-te sorrir e encontrar-te
Fl. [1]v
Que posso ainda dizer-te? Que vale falar-te de como desejaria comemorar esse
dia, contigo, este ano, depois de tudo quanto aprendemos?

Penso que talvez cá venhas, talvez te veja, talvez conversemos. Sou muito e
muito teu amigo, d um modo único e profundo. Faz-me falta saber de ti. Inquieto-me por ti.

Entretanto, renovo esse profundo, amigo e terno abraço de parabéns.

Beijo-te

[N]




Contexto
Prisão



Palavras Chave

Tipo: votos
História: prisão
Sociologia: família




Suporte Material

Suporte: uma folha de papel pautado de 30 linhas escrita em ambas as faces; carimbo da censura da Cadeia do Forte de Peniche.
Medidas: 275mm × 211mm
Mancha Gráfica: uma linha em branco entre a fórmula de endereço e o início do texto.




Créditos

Transcrição: Ana Guilherme
Revisão: Mariana Gomes
Codificação DALF: Ana Guilherme




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