1974. Carta de amizade de um exilado em Itália para uma amiga. De Florença para [Lisboa]. FLY1571

FLY1571
Carta de amizade de um exilado em Itália para uma amiga. De Florença para [Lisboa].
Carta parcialmente transcrita. O texto completo é de acesso restrito. 

Data
23/03/1974

Referência Arquivística
N.A..
Arquivo Privado, Arquivo Privado, Fólios 1r-2v

Resumo
O autor desculpa-se pelo seu discurso em cartas anteriores; comenta o tempo e a beleza de Florença e narra um espetáculo de Amália Rodrigues que muito o surpreendeu.

Local
Florença

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Autor | Destinatário | Contexto | Palavras Chave | Suporte Material | Créditos


Texto

Fl. 1r

Firenze

23/3/74

Muito querida [N]

[...]
A primavera chegou definitivamente.
Neste sol, neste ar, nesta luz, Florença
encontra a sua dimensão própria vê-se
que foi feita debaixo deste clima.

A exactidão da linha, o equilibrio perfeito,
a sobriedade clássica vivem necessariamente
desta luz. É tudo duma clareza, duma
pureza como se a atmosfera não existisse,
só o vago, de tão lavado que é este
ar. O Arno está lindo; depois das cheias,
as suas águas correm de um verde
esmeralda maravilhoso que deixa ver o
fluido e até os peixes.
Fl. 1v
O grande contra desta chegada triunfal
da primavera (já fez 23º c) é a chegada
funesta dos turistas. Sobretudo nos fins-
de-semana as pessoas não cabem nas
ruas. Eu meto-me dentro de casa ou
então vou para o Arno e sento-me
ali ao lado dos pescadores "só para ver,
só para olhar sem ser reparado".

Segundo a minha opinião, mais que
de tarde, Florença dis vive nas primei-
ras horas da manhã. Não queiras
saber o que é passar de manhã cedo
sobre uma das pontes do Arno...
[...]
Fl. 2r
[...]
Ontem á noite fui ao teatro della Pergola
ver a Amalia Rodrigues. Nunca pensei
que tivesse uma aceitação tão grande aqui.
Teatro esgotado.

Abriu o espectáculo o grupo de guitarristas
que executaram 2 peças.

Eu, que me penso o mais anti-saudosista
possivel, não fui capaz. Ao ouvir os
primeiros sons daquelas musicas a
minha pele transformou-se subito em
pele de galinha. O que eu tinha a ver
com aquilo não sei, só sei que o som
o ritmo estava dentro de mim como
se o ouvisso de há séculos.

Depois veio ela. Toda de negro, da
galeria (quis comprar bilhete de plateia
mas não pude - 4.000 liras) parecia linda,
bastante jovem. A sua voz ENCHIA o
teatro. Fiquei extremamente surpreendido
Fl. 2v
porque nunca pensei na Amália como
se revelou: uma capacidade interpretativa,
uma força indescritíveis.

Consegue transmitir um vigor e uma
tensão que arrebata as pessoas. A sua
voz é um instrumento que comanda
perfeitamente, extraindo dele todos os
sons possiveis. Depois a importancia
das mãos aqueles dedos que tremem,
que chamam, que dançam.

Cantou algumas canções espanholas e
outras italianas. Das portuguesas, as
mais conhecidas. Mariquinhas, Coimbra,
Lisboa Antiga, Cochicho, Malhão e por aí
fora.

No final todo o Teatro [...] cantava com
ela e foi aquilo a que se chama um
exito. Não é que seja um espectaculo
interessante, vivo, ritmado. É só
uma actuação duma VEDETA. Vai-se
só para ouvir e ver aquela mulher
e basta.


Contexto
Exílio



Palavras Chave

Tipo: notícias
História: exílio
Sociologia: educação, cultura, obras e espaços públicos




Suporte Material

Suporte: duas folhas de papel de carta escritas em ambos os lados.
Medidas: 285mm × 219mm
Mancha Gráfica: sem linhas em branco separando a fórmula de endereço das restantes linhas.




Créditos

Transcrição: Leonor Tavares
Revisão: Leonor Tavares
Codificação DALF: Leonor Tavares
Contextualização: Ángel Rodríguez Gallardo




Discorda da nossa leitura? Por favor escreva-nos: cardsclul@gmail.com