FLY2256 Data Referência Arquivística Resumo Local Cartas relacionadas Download XML Download em formato PDF |
Sobrescrito
Destinatário
Exmo SR Texto Fl. [1]r MAIO/73 25 Meus queridos pais A meio de mais uma manhã de Intendência, cávão as notícias. Tudo tem corrido dentro da pacatez habitual desde o trabalho às diversões Hoje apresentou-se o novo sub-chefe, um tenente coronel que já cá andou como major e que é na verdade muito mais simpático do que o "malfadado" Ten cor [N]. Ontem fui à 1a Repartição do Quartel General saber do meu substituto e em que ponto vai a sua nomea ção: ficaram de me dar hoje a resposta para depois entrar em contacto com o [N] marido da [N] que trabalha na Repartição de oficiais do Ministério do Exér cito. Entretanto a temperatura vai muito agra dável: há um ventinho que sopra fresco durante o dia e à noite chega mesmo a fazer frio que até apetece andar de "pullover" Muito impressionado fiquei (já há uma semana) quando soube do naufrágio do barco lá para os lados de Timor e li o nome da [N] [N]: foi uma notícia que me estragou o passado fim de semana. Qual será a morada dos pais e dos sogros para mandar um cartão? É com certa curiosidade que aguardo. a próxima carta a fim de saber em que ponto é que vai o "nosso" assunto (sem pre muita discrição). Agradou? não agradou? a cor? o tamanho; a mamã já perdeu os Fl. [2]r as vergonhas e sente-se à vontade. Sobre a cor é que tenho as minhas duvidas porque fiquei com a impressão de que era escuro demais; enfim, em qualquer altura se pode modificar e dar a tonalidade preferida. Tenho recebido alguns jornais com as notícias da terra, o que além de ser curioso é uma forma de matar as saudades. Ainda não tive oportunidade de telefonar ao irmão da D [N]. ele já estará cá em Nanpula: vamos a ver se o faço amanhã á tarde para o prédio da força aérea; irá dar um jantarzinho de "borla"? es pero que sim. O Ten [N] falou-me nuns disturbios pro vocados por estudantes aí em Ponta Delgada - será verdade ou "aleivos" levantados pela mulher; disse-me que tinham partido carros na Rua do Passal e Rua Margarida de Chaves. Parece que no dia 9 de Junho há uma festa de meninos e meninas em casa do General [N] - o adjunto do [N] [N]; claro que a festa é dada pelos filhos com quem o grupo (o nosso) já travou amizade. Por agora é tudo. fico a aguardar noticias. A avó como está? Beijos com saudades [N] Contexto A guerra colonial, também chamada guerra do ultramar ou de libertação, consoante a posição assumida face à sua legitimidade, começou em 1961 e terminou em 1974 na sequência de um golpe militar, desencadeado no dia 25 de Abril, que derrubou a ditadura chefiada por Marcello Caetano. Durante 13 anos as forças armadas portuguesas combateram os movimentos de libertação dos territórios africanos de Angola (MPLA, UPA/FNLA, UNITA), Moçambique (FRELIMO) e Guiné (PAIGC). Pode caracterizar-se como tendo sido uma guerra de guerrilha que causou um grande desgaste nas forças armadas. Os militares enfrentavam forças ligeiras nativas, com grande mobilidade, apoiadas do exterior e vivendo na clandestinidade, muitas vezes misturadas com a população. Os antecedentes desta guerra remontam ao ambiente de mudança pós II Guerra Mundial. A vitória dos Aliados e a generalização dos valores democráticos criou condições nas colónias para o crescimento dos sentimentos nacionalistas que puseram em questão a dominação colonial das potências europeias. A ONU surge em 1945 nesse ambiente. No artigo 73 do Capítulo XI da sua Carta estabelecem-se princípios e obrigações dos países administrantes de territórios não autónomos. São assim consignados os direitos dos povos colonizados à autodeterminação e independência. Portugal é admitido na ONU apenas em 1955, após um entendimento entre os EUA e a URSS. Desde o início, o governo português é pressionado no sentido de preparar a independência das suas colónias. No entanto, Salazar, Presidente do Conselho, não vê razões para negociar argumentando que Portugal não tem colónias mas províncias ultramarinas, e que estas são parte integrante do território português. A guerra em Angola tem início em Março de 1961, com uma acção da UPA no norte que resultou em violentos massacres contra a população civil que habitava e trabalhava nas fazendas. O ataque do PAIGC ao quartel de Tite, em Janeiro de 1963, marca o início da guerra na Guiné. Em 1964 o conflito alastra a Moçambique com o ataque da Frelimo à localidade de Chai em Cabo Delgado. No início da guerra em Angola, os efectivos militares eram reduzidos e estavam mal armados e equipados. A partir daí e até 1974 irão ser constantemente reforçados. Mas a contestação à guerra vai sentir-se nos números. Basta referir que em 1971, por exemplo, o número de faltosos à inspecção está acima dos 20% do total de recenseados. No fim da guerra, em 1974, a situação militar em Angola era considerada sob controle, o que não acontecia na Guiné e em Moçambique. A Guiné declarara a independência unilateral em 14 de Setembro de 1973 e é reconhecida por cerca de 80 países pertencentes à ONU. Em Moçambique a situação não deixará de se agravar, com o avanço da Frelimo para zonas cada vez mais perto da Beira, expandindo a sua acção em redor da barragem de Cabora Bassa e ameaçando separar o norte do sul do território. Do lado português há a registar cerca de 8300 mortos cujos nomes se encontram num monumento situado em Belém. O número de grandes deficientes é de cerca de 15600 mas o número total será muito superior. Estiveram envolvidos cerca de 600 mil militares da metrópole ou 800 mil, se considerarmos a incorporação militar dos territórios africanos. Esta guerra exigiu um grande esforço financeiro a Portugal, acentuado pela longa duração e pela dispersão por 3 vastos territórios, condicionou as prioridades do Estado e alterou a estrutura da despesa pública. O regime manteve uma grande rigidez ao não procurar uma solução política para a guerra e ao não aceitar o tratamento de cada caso de forma diferente. A emergência da guerra fria e o alinhamento do mundo em dois blocos liderados pelos EUA e URSS, levou à disputa das respectivas zonas de influência, o que possibilitou um apoio sistemático aos movimentos de libertação existentes nas colónias. Palavras Chave Tipo: notícias Suporte Material Suporte:
duas meias folhas de papel branco de tamanho A4 escritas no rosto.
Créditos Transcrição: Mariana Gomes Discorda da nossa leitura? Por favor escreva-nos: cardsclul@gmail.com |
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