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Texto
Fl. [1]r
Jan 1957
Querida [N]
Encontro-me neste momento na Madeira. São 8 Horasem ponto (em Lxa são nove). O Niassa ficou ao largo
e vim pa terra num gasolina. Escrevo-te numa esplanada
à porta dum café "Golden gate".
Que saudades que eu tenho.
[...]
Depois de o barco dar a volta ainda fui ao outro lado
pa dar o último adeus. Não sei se me viste. Eu já não
te reconhecia. Vi um lenço e uma blusa brancos julguei
que eras tu, levantava o braço a dar o derradeiro adeus.
Depois fui tomar o "lunch". Após este fui pa a sala de
fumo que fica no mesmo andar do camarote. Aí
eu e o meu colega travámos os primeiros conhecimentos
com o comissário do barco e três rapazes que nos
convidaram pa o jogar "King". O meu colega jogou e
tratei de fazer a escrita. A partida foi interrompida
porque os três colegas foram jantar (1o turno). Fui até
ao camarote, deitei-me e por muito tempo fixei
os meus olhos na fotografia na MINHA [N].
Por volta das 7 e 1/2 fui jantar e gostei. Na verdade,
é um ambiente selecto. A sala de jantar fica à
esquerda antes de se subir pa os camarotes. Findo
o jantar fui pa o camarote eram 8 e 1/2 porque
me sentia um pouco fatigado e só sai hoje (24)
de manhã. Quer dizer, estive desde o dia 22 das
20 e 30 até às 8 do dia 24 sempre no camarote e
quase sempre deitado. Na manhã do dia 23 levan-
tei-me pa ir à casa de banho, e em virtude da
grande vacilação fiquei mal disposto. Não consegui
vomitar porque tinha o estômago vazio. O criado
trouxe-me umas torradas. À hora do almoço
um bife e fruta e depois ao jantar pescadinha
de "cauda nos lábios" e lombos de porco e fruta.
Os intervalos das refeições eram preenchidos
com "sonecas". De vez em quando olhava pa
a minha [N]. O meu colega já goza
comigo por ver fazer-me tantas vezes isto. Já sabe
que quando pego na carteira é pa te ver.
Fl. [1]v
Recebi o teu telegrama que me animou. Foi-me entregue
por volta das oito horas. Sei que o expediste às 10 e
tal e receberam-no às 4 da tarde. Em toda
a correspondência pa bordo deves nomear o camarote
[...] a fim de facilitar a entrega da
mesma.
Hoje (24) de manhã tomei um duche e preparei-me
pa visitar a Madeira. Estou à espera do meu
camarada pa me mostrar a Pérola do Atlântico.(
(é bastante bonita). Andavas tão preocupada pa
que nevasse e assim eu teria ocasião de ver neve.
Cá na Madeira o cimo das montanhas estão
cobertos de neve. O tempo está um pouco nube-
lado, mas a temperatura é agradável.
[...]
O Niassa só deve partir às 4 horas da tarde. Logo
devo ir dar uma volta no automóvel do meu
colega e assim terei oportunidade visitar os lugares
mais aprazíveis desta encantadora ilha.
O que contam da ilha é verdade.
Meu amor, como tudo isto era muito melhor
se tu estivesses junto de mim. Ainda hei-de
ter essa oportunidade.
No barco pensei em escrever-te, mas não
consegui devido à oscilação. Muitas pessoas
enjoaram. O meu colega que está habituado
a esta viagem (êle é da Madeira) também enjoou.
Ele está convencido que eu não sei. Apetecia-me
ler mas também não consigo. Terei de permanecer
deitado na cama. Até à Madeira o mar
está mais agitado. Agora pa diante está
mais calmo e faço votos pa que a viagem corra
melhor. Depois no cabo ainda será pior.
[...]
Se me autorizas
dou-te um beijo de parabéns.
Cumprimentos às tuas amigas, ao [N] e
ao [N].
Aceita todo amor
do sempre TEU
[N]
Funchal, 24/1/57
Contexto
Emigração
Palavras Chave
Tipo: expressão de amor
História: emigração
Sociologia: intimidade, saúde, cultura
Suporte Material
Suporte:
carta manuscrita em papel de carta sem linhas.
Medidas: 268mm × 160mm
Mancha Gráfica:
sem linhas em branco entre a fórmula de endereço e o início do texto.
Créditos
Transcrição: Leonor Tavares
Revisão: Rita Marquilhas
Codificação DALF: Leonor Tavares
Contextualização: Leonor Tavares
Discorda da nossa leitura? Por favor escreva-nos: cardsclul@gmail.com