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Texto Fl. [1]r Caxias, [N]: Saude para todos vós!A [N] contou-me a tua reacção no sábado; estava, de certo modo, ferida por tu teres levado a [N]. Eu disse-lhe clara- mente que teria procedido como tu procedeste, que tinhas tido razão e que não se justificava a susceptibilidade da [N]. Pedi-lhe mesmo para te telefonar hoje, 2a feira, a dizer-te o que eu pensava e a esclarecer contigo as coisas, para não ficarem de pé mal-entendidos entre vós. Em suma: a [N] viera, disse-lhe, passar o fim de semana com a [N] e era à [N] que cabia tomar, sem esforço nem espirito de "obrigação", conta da miudinha; que se a [N] não podia fazê-lo então não deveria ter ido buscar a [N]; que não era a [N] que "escolhia" com quem ficava ou onde ia: a [N] ficava e ia com a [N] e a [N] deveria planear o fim de semana de acordo com isso, não como uma obrigação - em tal caso não tem interesse nenhum -, mas como uma coisa "gostosa". Se tu (bem ou mal) admitiste que a [N] estava a "causar problemas" então muito natural- mente fizeste o que eu faria: levaste-a. A [N] não pôde deixar de compreender e acabar por concordar. Simplesmente insistia - e é verdade! - que a [N] não causava problemas, que adora a [N], que apenas julgou não dever contrariar a [N] que queria ir ao casamento, etc. Creio que a [N] estava a ser franca e creio-o até porque a [N] estava triste e sentida por a [N] não ter ficado com ela: que tu não tinhas compreendido o seu objectivo e o que ela sente pela [N]. Na minha opinião deves ter em conta o que a [N] diz com indiscutível, quanto a mim, sinceridade. É claro que eu parto do princípio que o problema de onde e quando te entregar a [N], no domingo, foi um pormenor sem importancia, embora tivesse surgido com relevância aparente... Porque quanto a isso - foi o que vi com a [N] ontem - a solução é simples: a [N] vai buscar a [N] onde e quando tu disseres e vai-te levar onde e quando te convier. Eu sei que tu levantaste a questão da [N] não vir, no domingo, à visita. Há aí dois aspectos distintos que explico. Em primeiro lugar, a vinda e depois não vinda da [N] que "atrapalhou" tudo. Ora eu tinha que ver em pormenor e com cuidado vários assuntos com a [N], ligados à sua vida escolar, à sua saude, a problemas ligados com provavel vinda da [N], transferências cambiais, etc, etc - inadiáveis. Estava a contar com a [N] e, portanto, com a tua vinda à visita no domingo: o que possibilitava eu ter visita com a [N] das 13 às 15 e convosco (tu, [N], [N]) das 15 às 17. Embora meu Pai falasse só na "possível" vinda da [N], fui surpreendido pela sua não vinda, mas não podia pedir-te para cá vires, de novo, ontem e também não podia adiar a visita a sós com a [N]: compreende-o, se fazes favor. Em segundo lugar, não me pareceu "decisivo" que a [N] viesse cá no domingo; ao querer que a [N] passe o fim de semana com a [N], o meu objectivo central é que a [N] e a [N] se estimem e se dêem como irmãs, brinquem juntas, etc: pela [N] que gostará de andar no "pagode" e de ser acarinhada também pela [N]; pela [N] (excessivamente só em lisboa) que expandirá a sua ternura real pela miudinha; e também Fl. [1]v pelo descanso que te possibilita. Só secundariamente, é meu objectivo que a [N] me traga a [N]. Secundariamente porquê? Porque tu tens cá trazido bastantes vezes a [N] e eu não quereria, de modo algum, que o deixasses de fazer. Então seria preferível que a [N] não fosse com a [N] e que apenas continuasse a vir cá contigo, etc - por muitas razões sobre que, aliás, já conver- sámos. Em suma, a [N] passar um fim de semana com a [N] não pretende de modo nenhum - nem poderia sequer - substituir as tuas vindas cá com a [N]. É certo que, em condições normais, a [N] teria vindo com a [N], no sabado e no domingo, à visita e só as razões que te expliquei já o impediram. Compreendo bem que tu deves estar "irritada" com estes azares todos nas vindas cá: domingo anterior, estava eu com o dr [N]; este sábado, a [N] não veio (eu sublinhei que meu Pai disse apenas "possível"). É claro que não posso fazer nada e quero acreditar que tu o vês com nitidez e sem veres nos factos senão o que os factos são: coincidências aborre- cidas, muito aborrecidas também para mim sobretudo por ti, mas que não pude impedir que acontecessem. Quero dizer-te com muita sinceridade que me preocupa bastante que possas pensar d outro modo: tu, às vezes, deixas-te ir atrás d uma imagi- nação que sempre me inquieta... A sério, creio que compreendes que tambem eu fiquei aborrecido e também eu fiquei irritado e que também eu não gostei nada, mas nada que cá tivesses vindo em vão: por muitas razões e também porque gostava de ter conversado contigo. (Não sei se já te te disse que a consulta do Dr [N] estava marcada para dia [D] (o que me forçou a não comemorar, como tanto e tanto queria, com a [N] os seus anos que são nesse dia) e que só no dia [D] à tarde fui prevenido que, afazeres profissionais súbitos, o tinham obrigado a adiar a sua vinda para o dia seguinte, domingo... Como vês são umas coisas atrás das outras a correr à desfeição e independentes da minha vontade!) Já com o problema da vinda da [N] eu penso que a tua vinda podia ter sido evitada, etc - mas não por mim. Por isso, escrevo hoje à minha irmã - e pedi sábado que a [N] o transmitisse a meu Pai - pondo claramente a questão e insistindo. Em resumo: a) por mim nunca é inconveniente, muito pelo contrário, a vinda da [N] ver-me; b) não é preciso sequer prevenir-me; c) em vez de me escreverem a mim, que devem escrever-te a ti - ou telegrafar - dizendo [N] vai visita dia tal, etc; d) no caso de, à ultima hora, não poder vir é a ti que devem, escrevendo ou telegrafando, prevenir-te. Insisto que escrevam (para R [L], [D] - [D], etc) porque tefonando podem não te encontrar, etc. Escrevendo tu, em principio, recebes a correspondência: se não receberes... o problema é teu, é contigo, etc; mas o essencial é que não me façam de mim intermediário em coisas tão simples, estando eu preso, logo cheio de limitações, etc. que me impossibilitam de te prevenir de que a [N] vem ou que já não vem, etc. Estou certo que a [N] passará a fazer como lhe digo, isto é, a escrever-te prevenindo-te a ti directamente de vindas ou não vindas. Julgo que tu estarás de acordo e vês bem porque escrevo neste sentido e com força às minha irmã. Certo? Por fim - mas não é nada pouco importante para mim - dizer-te que me tenho deliciado, autenticamente deliciado, com o F Pessoa. Aliás sei que tu sabes quanto. Agradeço-te (-vos?) muito e muito, um pouco incomodado por calcular que foi caro... Mas contente porque me é uma "coisa" preciosa. Aliás, a Antologia que a [N] me ofereceu tambem me maravilha até porque tem montes de coisas que eu nunca tinha lido - não vinham na edição que eu conhecia. Abraços para todos vós, em especial para a [N] e muito em especial para ti [N] P.S.P.S - Peço-te o favor de me mandares dizer a idade do [N] e do [N]. E ainda o seguinte: se a [N] vê qualquer iconveniente em que eu tenha uma (ou mais) visitas com o [N], respeitando os seus estudos, etc, etc. Gostava de o conhecer. Peço-te que digas à [N] que eu gostei muito de a ver. [N] Contexto Prisão Palavras Chave Tipo: instruções Suporte Material Suporte:
uma folha de papel de carta pautado de 30 linhas escrita em ambas as faces.
Créditos Transcrição: Mariana Gomes Discorda da nossa leitura? Por favor escreva-nos: cardsclul@gmail.com |
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